PORQUE NÃO DEVEMOS ROTULAR O QUE É BRINCADEIRA DE MENINA E DE MENINO?

Ver um menino brincar com boneca e uma menina brincando com carrinho pode ser uma experiência assustadora para muitos pais. Entendo que a questão de gênero é algo muito forte na nossa cultura e por isso existe uma preocupação em relação a orientação sexual dos filhos no futuro. Mas, gostaria de chamar a atenção para observamos o que acontece quando nomeamos o azul como cor de menino e rosa de menina ou espada ser brincadeira de menino e casinha de menina.

Em primeiro lugar vale considerar que existe um fator hormonal que influencia na escolha da brincadeira. O hormônio da testosterona, presente nos meninos em maior intensidade, faz com que desejem brincadeiras que envolvam mais força e energia. Em contrapartida, a maior quantidade de hormônio estrógeno nas meninas gera um interesse por atividades e brincadeiras que envolvam mais afetividade e passividade. Ambos os sexos possuem os dois hormônios, e por isso, é natural meninas quererem brincar de luta ou meninos brincar com bonecas.

É importante lembrar que desde bebês, as crianças se interessam por uma variedade de coisas, independente de ser brinquedo ou não, como a panela, caixa e baton. A criança não escolhe a brincadeira pela cor ou objeto e sim o quanto aquilo estimula toda sua curiosidade. Elas não nascem sabendo diferenciar o brincar de futebol ou casinha porque são meninos ou meninas. Brinca com tudo o que lhe desperta o interesse.

Outro fato a ser considerado é que hoje mulheres e homens desempenham papeis semelhantes, a mulher trabalha, cuida da casa, da educação dos filhos e o homem também. São como um time, em que todos participam colaborando para um bom funcionamento da família e a criança observa e aprende com esses exemplos.

Aos poucos, de acordo com o contexto familiar e experiências sociais que a criança vive ao longo da infância, também pode fazer a classificação de gênero e criar suas preferências baseado nessas vivências.

Ao contrário do que se pensa o brincar livre dos rótulos, auxilia no desenvolvimento da criatividade, espontaneidade e relacionamento. Além disso, no faz de conta ela pode errar, experimentar outro final de uma mesma situação, possibilitando a resolução de problemas que a criança enfrenta no dia a dia.

Quando reforçamos a atitude que rotula o “isso é de menina e isso é de menino”, dificultamos a capacidade inata que as crianças têm de querer experimentar gestos, emoções e papéis diferentes.

Uma criança gostar de um determinado tipo de brincadeira não corresponde a uma identidade de gênero, o menino brincar com boneca não significa que ele tem uma predisposição para a homossexualidade, a brincadeira é apenas uma brincadeira. Em casos que o brincar de uma mesma brincadeira é repetitivo, em excesso e preocupa os pais, vale a pena observar como está a oferta de brinquedos e brincadeiras e a relação da criança com as pessoas. Talvez seja uma criança que queira legitimar seu lugar na família ou não tenha tanta possibilidade de explorar outras brincadeiras.

O nosso desafio é oferecer essa liberdade de escolha para que elas possam brincar sem o peso do nosso julgamento que estabelece essa ligação da brincadeira com a sexualidade. A criança está ali brincando com o imaginário dela, se conhecendo, sentindo suas capacidades, dificuldades, experimentando sua força ou afetividade e de uma maneira muito inocente descobrindo o mundo através da brincadeira.

Com amor,

Ana Flávia Fernandes

9 de junho de 2016